Um Encontro de Tesouros

Exposição de Arte do 70.º Aniversário da Associação dos Calígrafos e Pintores Chineses Yu Un de Macau

Prefácio

 Ao longo de milhares de anos, a paisagem cultural chinesa tem sido enformada por salões artísticos, clubes de poesia e grupos dedicados à caligrafia, pintura e artes performativas tradicionais. Hoje, numa época em que as pessoas frequentemente se encontram “na nuvem” estes salões tradicionais, encontros de poetas, eruditos e artistas podem parecer obsoletos. No entanto, no decorrer do último século, muitos dos calígrafos e pintores de Macau cultivaram relações relevantes através da troca de ideias artísticas recorrendo ao pincel e à tinta nesse tipo de salões. Na verdade, a memória recente fala-nos de um restaurante da cidade que se transformou num ponto de encontro para artistas. Por outro lado, Macau é uma cidade pequena, na qual as pessoas têm laços próximos entre si e estes salões ainda são populares, constituindo uma peça importante no desenvolvimento da cena artística local. 

Há sete décadas, um grupo de entusiastas da caligrafia e da pintura oriundos de Hong Kong e Macau começou a encontrar-se todos os meses no Restaurante Yu Un, sito na Travessa do Auto Novo. Ficando conhecido como Salão Yu Un, criaram obras de caligrafia, pinturas, poesia e gravação de sinetes em conjunto e trocavam ideias. Sem qualquer intenção, este grupo alinhar-se-ia com a cena artística de Lingnan, assim elevando o desenvolvimento artístico e cultural de Macau a um novo patamar. O Salão viria a crescer e ficar conhecido como Associação dos Calígrafos e Pintores Chineses Yu Un de Macau. A promoção dos talentos da Associação fomenta a apreciação daquelas artes na cidade e na região. Hoje, a Associação é uma crucial plataforma de intercâmbio de pintura e caligrafia chinesa na cidade. 

Para comemorar este aniversário, o Museu de Arte de Macau tem o prazer de apresentar Um Encontro de Tesouros: Exposição de Arte do 70.º Aniversário da Associação dos Calígrafos e Pintores Chineses Yu Un de Macau. A mostra apresenta 200 notáveis obras por sete artistas: Chui Tak Kei, Deng Fen, Luo Shuzhong, Situ Qi, Gan Heng, Lin Jin e U Kuan Wai. Uma série de gravações de sinetes, obras de caligrafia e pintura dedicadas aos temas de paisagem, figuras, pássaros-e-flores, peixes e insectos poderão ser apreciadas, incluindo versos, rolos, placas horizontais, decalques, álbuns, leques e cartas. As peças exibem exaustivamente os talentos e feitos destes artistas veteranos, oferecendo uma valiosa perspectiva do mundo destes criativos virtuosos e da história da caligrafia e pintura em Macau. 

Os sete veteranos mantinham estreitas relações enquanto amigos, professores e estudantes, mas cada um tinha conceitos artísticos diferentes e estilos artísticos únicos. Alguns seguiram na esteira dos antigos mestres, mas sem se deixarem condicionar pelas tradições, tentando trazer novas ideias à pintura tradicional chinesa. Alguns, abriram novos caminhos, mas sempre seguindo o princípio da Escola de Lingnan que diz “a mistura eclética dos estilos pictóricos do Oriente e do Ocidente devem ser abraçados, pois reúnem técnicas antigas e modernas”. Alguns dos artistas criaram obras segundo as regras de pintura gongbi (meticulosa), mas, sem se deixarem constranger por princípios tradicionais, integraram com ousadia as técnicas ocidentais de aguarela nas suas obras. Estes sete talentos tinham elevados ideais, emulando as atitudes das dinastias Tang e Ming. A sua abertura também nos recorda dos famosos Sete Sábios do Bosque de Bambu (um grupo de eruditos do século III). 

Por outro lado, estes sete criativos oferecem-nos visões artísticas únicas do seu próprio mundo. Quando Deng Fen discutia caligrafia e pintura chinesa, este artista livre e ambicioso acentuava a importância das imagens, fazendo notar que “em geral, a pintura chinesa tem uma forte qualidade poética. As imagens, nas suas abordagens livres e vívidas, devem focar-se na criação de vitalidade”. Luo Shuzhong, notável pela sua personalidade aberta e excêntrica, frequentemente escrevia versos auto-irónicos nos seus sinetes, um dos quais sugere que nunca seria famoso dada a sua abertura. Aos 68 anos de idade, gravou um sinete com a inscrição “68 anos a estudar sem fazer nome”. Discordava da rudeza e vigor do famoso pintor Qi Baishi, que a muitos fascinava à época, e considerava que a arte de gravação de sinetes deveria permanecer simples e modesta. 

Todos estes veteranos artistas foram pintores de excelência, distinguindo-se em vários géneros e temas ao mesmo tempo que refinavam as suas capacidades. A exposição dá primazia as suas mais emblemáticas pinturas de paisagens e pássaros-e-flores, mas também à sua poesia e obras caligráficas. As peças incluem os bambus e orquídeas de Chui Tak Kei, a técnica “tigre negro” de imitar decalques de pedras de tinta de Luo Shuzhong, as senhoras de Deng Fen, as flores de sumaúma de Situ Qi, os açores de Gan Heng, os quatro estilos caligráficos de Lin Jin e os peixes dourados de U Kuan Wai. Em escrita ou pincelada vigorosa, com ousadia, fluidez e elegância, cada obra transmite as personalidades distintas dos artistas e encapsula as suas extraordinárias imagens e espírito artístico. 

Estes artistas altamente talentosos eram mestres do pincel e da tinta. Criavam com harmonia independentemente do tipo de composição, cores, tipo de pincelada ou de imagem. Colaboravam na criação de poesia, caligrafia, pintura e gravação de sinetes como se as obras fossem da autoria de uma só pessoa. Os seus trabalhos transmitem uma fluida expressão de conceitos e pincelada, assim como uma forte relação pessoal. Os sete mestres mantiveram firme a sua amizade, partilhando o entusiasmo artístico, apoiando-se mutuamente e mesmo prometendo escrever os epitáfios uns dos outros. As histórias deixadas por eles ainda são lembradas com carinho em Macau. 

Yu Un é uma presença marcante em Macau, mas procura expandir o seu trabalho para além da cidade. Uma pioneira na formação de alianças artísticas na Grande Baía, a Associação atrai entusiastas de arte oriundos de outras regiões. Luo Shuzhong e Deng Fen, que viviam em Hong Kong, juntavam-se regularmente ao grupo. Visitar o Salão Yu Un fez sempre parte do itinerário de calígrafos e pintores de Hong Kong que vinham a Macau. O Salão era também uma importante plataforma para os círculos culturais de Hong Kong e Macau à época. Desde as décadas de 1960 e 1970, a Yu Un organizou numerosas mostras do trabalho dos seus membros, ao mesmo tempo que fomentava o intercâmbio com os seus pares no Interior da China, Hong Kong e mesmo em Macau, tendo desenvolvido a caligrafia, pintura e gravação de sinetes e transmitindo toda uma rica herança cultural. 

Macau alberga numerosos clubes e associações, com as suas próprias missões e princípios. Em contraste, a Yu Un tem um objectivo simples – criar amizade entre entusiastas de arte. A Associação não é dominada por qualquer perspectiva artística específica e também nunca exige compromissos específicos aos membros. Nos seus inícios, os seus membros não tinham cargo nem posição. A sua relação dependia somente de um espírito colectivo. Em geral, a prática de um artista tende a reflectir os seus sentimentos, experiências culturais e condições de vida. Os veteranos da Yu Un optimizaram as tradições de diferentes escolas procurando, ao mesmo tempo, novas ideias e perspectivas. Com a sua mistura eclética de expressões, trouxeram também novas abordagens. Os artistas da Yu Un dedicaram-se à promoção da cultura chinesa na Macau moderna, onde o Oriente e o Ocidente se encontraram. Não deram sinais de serem condicionados por tradições e foram absorvendo novos membros – Mio Pang Fei, Un Chi Iam e Kwok Woon – que praticavam técnicas ocidentais de pintura. O seu empenho da cena artística local garantiu um lugar único à Yu Un em Macau. 

Esta exposição celebra o jubileu de platina da Yu Un, mostrando peças da colecção do Museu de Arte de Macau assim como valiosas obras emprestadas por entusiásticos coleccionadores de arte. Há um poema que diz “é raro viver até aos 70”. Sendo a coluna dorsal da cena artística de Macau, a Yu Un continuou a crescer através de tempos de mudança. Um outro dizer chinês afirma “70 é a idade em que devemos seguir o nosso coração”. Os membros da Yu Un nunca deixaram de se dedicar à criação de mais obras de arte e perseguir os seus sonhos juntos. A sua dedicação à promoção das tradições chinesas é, simplesmente, um extraordinário modelo a seguir por gerações presentes e futuras de artistas. 

Un Sio San 
Directora do Museu de Arte de Macau

Piso 4 do Museu de Arte de Macau

Data de Abertura:
2023/05/19 18:30
Duração:
2023/05/20 - 2023/07/30