PREFÁCIO
Ponteado por templos, mosteiros e stupas, o planalto tibetano, evoca um sentido do sagrado, do misterioso e do puro. Situado a uma altitude de 3,847 metros, o magnífico Mosteiro de Tashi Lhunpo, em Shigatse, é disso um exemplo maior, tendo fascinado inúmeros visitantes.
O budismo tibetano desenvolveu características autóctones e étnicas distintas, acabando por se tornar numa parte importante do sistema budista chinês. Fundado em 1447, o Mosteiro de Tashi Lhunpo é um dos quatro grandes mosteiros da linhagem Gelug do budismo tibetano. Este prestigiado mosteiro é também a sede tradicional dos Panchen Lamas. Alguns dos visitantes poderão ter a oportunidade de assistir às grandiosas leituras dos sutras ou aos vivos debates filosóficos ou mesmo presenciar o Festival de Dança Cham. Contudo, é raro poder aceder à colecção de tesouros do mosteiro. Localizado no Tibete interior, Tashi Lhunpo tem uma rica história, mantendo laços próximos com a Cidade Proíbida, que são desconhecidos de muitos.
O budismo tibetano manteve relações estreitas com as cortes das dinastias Yuan, Ming e Qing. Os imperadores Qing implementaram mesmo uma política conciliatória apoiando a chamada Escola dos Chapéus Amarelos (a linhagem Gelug) para apaziguar os mongóis. Os Panchen Lamas estabeleceram elos duradouros com a corte Qing, cujo ponto alto foi a visita do sexto Panchen Lama a Pequim para o aniversário do imperador Qianlong. Da viagem restou um número substancial de álbuns, sinetes e relíquias culturais que testemunha as contribuições dos Panchen Lamas para a manutenção da paz e estabilidade no Tibete. No Museu do Palácio existem edifícios budistas tibetanos, relíquias culturais e rituais que reflectem a reverência da família real Qing para com aquela religião e ensinamentos, que foram elementos importantes no moldar da cultura da corte Qing.
O Museu de Arte de Macau (MAM) tem como responsabilidade a promoção da cultura chinesa tradicional. Em 2003, o MAM juntou forças com o Museu do Palácio para apresentar Essência Luminosa: Relíquias do Budismo Tibetano no Palácio Imperial. Duas décadas depois, com o apoio do Museu do Palácio, do Instituto do Património Cultural da Região Autónoma do Tibete e do Mosteiro de Tashi Lhunpo, o MAM apresenta agora Eminência Dourada: Tesouros do Museu do Palácio e do Mosteiro de Tashi Lhunpo. A exposição exibe 137 tesouros, nomeadamente relíquias culturais budistas oriundas de Pequim e do Tibete, presentes oferecidos pelos Panchen Lamas aos imperadores Qing e presentes oferecidos aos Panchen Lamas pela corte Qing. Esta exposição constitui, assim, uma oportunidade de incalculável valor para o público na região de Lingnan vivenciar a essência cultural das planícies centrais e do Tibete. Os visitantes poderão admirar a excepcional perícia e estética das peças expostas e obter uma compreensão mais profunda das conexões entre os diversos grupos étnicos da nação chinesa.
Esta exposição, a primeira do Mosteiro de Tashi Lhunpo fora do continente chinês, traz-nos uma substancial e espectacular colecção de relíquias culturais, em que se incluem escrituras, caligrafias, pinturas, thangkas, alfaias rituais, esculturas budistas, sinetes, peças de porcelana, facas e arneses para cavalos. A maioria das peças são oferendas oriundas da Mongólia e do Tibete e que pertencem ao espólio do Museu do Palácio, antigos artefactos do grupo étnico Han e da região dos Himalaias, guardadas no Mosteiro de Tashi Lhunpo, a par de refinados tesouros produzidos pelas Oficinais Imperiais Qing, que revelam uma combinação de estilos Han, manchu e tibetanos e usam materiais únicos, como vidro, esmalte e turquesa. Estes tesouros, que exemplificam os contactos entre a corte e as várias regiões, assim como as interacções entre os imperadores e o budismo, também testemunham as trocas culturais entre a China o Nepal e a Índia. Tratam-se de tesouros com um tremendo valor religioso, histórico, étnico e artístico.
O Mosteiro de Tashi Lhunpo foi um importante centro de educação budista e o âmago artístico do Tibete nas dinastias Ming e Qing. A arte do budismo tibetano caracteriza-se por um poderoso impacto visual. Podem tratar-se de solenes e calmos Budas ou de divindades iradas, mas todos constituem upayas, ou meios hábeis, destinados a libertar todos os seres. Por outro lado, a oficina oficial de produção de artefactos do mosteiro, Tashikitsel, também produziu estátuas em liga de cobre, ao longo dos anos, no estilo tashilima, cuja refinada perícia técnica e cores magníficas cativaram o imperador Qianlong e influenciaram a estética da produção de esculturas budistas na corte Qing.
O mosteiro destaca-se por dois importantes artistas que ali estudaram as doutrinas budistas e criaram obras de arte: Menla Dondrup (sMan bla don grub), que estabeleceu a escola Menri (sMan ris) de pintura, e Choying Gyatso (Chos dbyings rgya mtsho), que fundou a escola Mensa (sMan gsar), também conhecida por Nova Escola Menri. Ambos se afastaram dos estilos artísticos dos Himalaias, introduzindo um novo estilo que se mesclou com as influências Han e tibetanas. Estas obras apresentam uma composição e formato esplêndidos com refinadas linhas e curvas. Na verdade, estes artistas tiveram um profundo impacto na pintura moderna do Tibete. Esta exposição mostra um conjunto excepcional de esculturas budistas tashilima, estatuária produzida na corte Qing e notáveis thangkas de diferentes períodos, oferecendo ao público uma visão da evolução, inclusividade e inovação artísticas ao longo dos séculos.
O nome Tashi Lhunpo significa “auspicioso Sumeru” (o auspicioso Monte Meru) em tibetano. Segundo os arquivos da corte Qing, o mosteiro é conhecido por “Templo de Sumeru, das Bênçãos e da Longevidade”. Com esta exposição de grande escala, o MAM tem o prazer de reforçar a colaboração com o seu parceiro de longa data, o Museu do Palácio, e estabelecer uma valiosa amizade com o Mosteiro de Tashi Lhunpo, conhecido pelo seu rico património cultural. Para celebrar os 25 anos da reunificação de Macau com a Pátria, o MAM traz as extraordinárias colecções do Museu do Palácio e do “Templo de Sumeru” a Macau para revelar a profundidade da arte budista tibetana e a unidade multiétnica inclusiva da nação chinesa. Gostaria, portanto, de exprimir a minha profunda gratidão pelo apoio dos líderes e especialistas de todas as instituições envolvidas assim como os esforços de todos os colegas. O seu trabalho árduo superou o clima do planalto, as longas distâncias e permitiu, finalmente, obter resultados soberbos.
Habitualmente, as exposições no MAM servem para dar visibilidade às suas colecções, mas o nosso papel na tornou-se, na actualidade, cada vez mais diversificado. O nosso objectivo é disseminar conhecimento e a todos beneficiar nutrindo o coração das pessoas com cultura e arte. Por isso estendo os maiores votos de sucesso a esta grande exposição, que une Pequim, o Tibete e Macau. Possa ela trazer felicidade, revelar a graciosidade de um lugar sagrado e manifestar a beleza das diversas culturas da nação chinesa.
Un Sio San
Directora do Museu de Arte de Macau